Judélio Carmo - inigualável e saudoso semeador de utopias

 



Este livro escrito sobre Judélio Carmo é um registro histórico e uma merecida homenagem para o homem que inaugurou a modernidade em Alagoinhas, ele catalisou as forças progressistas de sua época, colocou estas mentes para pensar a cidade, enquanto ele mesmo era uma usina de produzir inovações jamais imaginadas, por isto foi bem achado o título: "O semeador de utopias". "Se o poeta é que sonha o que vai ser real, bom sonhar coisas boas que o homem faz e esperar pelos frutos no quintal", diz a música cantada por Milton Nascimento. Mas Judélio não era de esperar, corria atrás, era um visionário obstinado. 


Com esta obra,  a cidade ganha duplamente, estabelece um marco temporal, um retrato de época importante e recebe referenciais significantes e uma noção de processo, de que nada surge do nada. Só a memória histórica faz de um aglomerado humano, um povo. Vamos muito agradecer este presente dos seus autores Luiz Eudes e Tom Torres. Estamos falando de um personagem ímpar, que foi vereador aos 21 anos(1966), duas vezes prefeito(1972/1982), assessor do secretário de Governo Murilo Leite (1990) e vice-prefeito (1996).


Assim ele descobriu que Alagoinhas está sobre um imenso rio de água com qualidade semelhante à mineral e que é uma das melhores do mundo. Pensou um polo cervejeitro 30 anos antes deste se consolidar. Falou em industrialização quando só existiam roças e comércio e cada um olhava para o seu umbigo, criou um distrito industrial, trouxe uma fábrica de beneficiamento de couro, com exportações para vários países e atraiu para o município o Projeto Cura, que deu início a remodelagem do centro urbano, inaugurando a macro drenagem, criando novas vias e novos espaços. Queria seguir, mas a oposição impediu que a revolução acontecesse. O CURA precisava continuar, serem tomadas outras parcelas de crédito para a realização de novos projetos.


Um livro muito bem escrito por Tom Torres e Luiz Eudes - eles dão um banho de boa narrativa, eles pintam Judélio Carmo com maestria, que mesmo para quem não o conheceu, sentirá sua presença magnética, graças a sensibilidade presente neste fazer textual. A produção também é uma curadoria pois traz textos do jornalista Belmiro Deusdete, Marco Antunes, Gustavo Carmo e depoimentos vários.


A morte de Celso Dantas - o nosso Celso Daniel - é emblemática da transformação popular que vivia a cidade, encantada por uma campanha em 1972, em que a zebra da lotérica virou simbolo, que  tornou prefeito um jovem com apenas 26 anos. Celso Dantas foi o vereador mais bem votado, foi maquiavelicamente assassinado, mas a trama envolvia também eliminar Judélio Carmo. Ao que parece aquilo tudo foi  muito para o cacique de plantão, que morreu sem perdoar Alagoinhas.E a cidade foi esquecida desde então. O ódio das elites foi tão grande, que, já que não o mataram, resolveram impeachá-lo, só que a justiça reverteu a sentença do legislativo.


Tudo isto é contado como um verdadeiro romance, com lances e episódios dramáticos e emocionantes. O livro é uma delicia de ser lido, o que faz jus ao biografado que era muito inteligente sim, mas também bastante espirituoso. Os causos contados pelos amigos super comprovam isto. Eu lembro de Judélio Carmo, em 1982/83, ele no seu auge político e eu um magricela estudante de jornalismo. Ele colocava a mão no meu ombro e saíamos coversando pelos corredores do G Barbosa, ele perguntando por Florisvaldo Mattos, Reinivaldo Brito, Rui Espinheira e sobre as novidades da capital. 


Depois ele me recebeu junto com uma amiga na governadoria, em 1990, quando conseguimos a instalação do sistema de abastecimento de água em uma vila de pescadores no Litoral Norte, onde trabalhávamos. As mulheres andavam dois quilômetros com latas d'água na cabeça e com bacias de roupas. Ele se compadeceu, aquele era Judélio. 


Bom, não há nada mais e melhor a fazer que ler este belo livro e saber que por aqui passou um ser diferenciado. Seu mal foi ter contrariado os poderosos e ter sido amado pela gente simples da cidade e ter-lhe dado voz. Teve a infelicidade de governar com gravíssimas restrições orçamentárias. Se tivéssemos um Judélio hoje...

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